domingo, 31 de agosto de 2008

A Europa Fortaleza


Foi aprovada recentemente, no Parlamento Europeu, a Directiva do Retorno, que representa na nossa perspectiva um autêntico retrocesso no quadro de uma política realista e adaptada aos nossos dias, que seria aconselhável ser implementada nos espaços de acolhimento dos fluxos migratórios, em particular na Europa. Esta directiva, assente numa visão difusa, errada e preconceituosa em torno das migrações, desfoca de forma primária a questão essencial. Todos nós estamos de acordo que é preciso um combate sério em relação à imigração irregular, sendo necessário o desenvolvimento de acções e medidas concretas no sentido de potenciar que os fluxos migratórios se concretizem dentro da regularidade. A opinião pública, por sua vez, tem uma visão completamente distorcida das migrações, sendo que as ideias e respostas ponderadas e realistas estão cada vez mais ausentes do debate. Mas também é uma verdade que a aprovação desta Directiva assenta numa perspectiva ideológica anti-imigração que, gradualmente, vem ganhando terreno nesta Europa que se quer construir em sólidos princípios de defesa dos Direitos Humanos. Por outro lado, a visibilidade que se empresta à imigração irregular (como é o caso desta directiva) reforça a percepção de que a maior parte dos imigrantes são indocumentados ou que os fluxos migratórios ocorrem de forma não autorizada. O problema não está neste diagnóstico, ou seja, que é preciso retirar o controlo dos fluxos migratórios das mãos das redes organizadas e de traficantes de pessoas. O problema radica nas opções que são apresentadas para atingir esse fim. A Directiva tem muitos aspectos condenáveis e podemos citar um exemplo: fixa, em dezoito meses, o período máximo de detenção de imigrantes indocumentados, antes da sua deportação. Como um primeiro passo, fixa um máximo de seis meses, que pode ser prolongado por mais doze meses no caso de falta de "cooperação" dos países de origem dos migrantes. É inaceitável que as pessoas que, pelo facto de não terem uma simples autorização administrativa, sejam tratadas como criminosas. A Directa prevê ainda que a partida de um imigrante indocumentado, suavemente chamada de "remoção", tenha lugar numa base "voluntária" mas que este, no caso de resistência, poderá ser forçado ou obrigado a sair, sendo depois proibida a sua entrada no território da UE durante cinco anos. No entanto a Eurostat divulgou no início da semana as projecções demográficas na Europa daqui a quase 50 anos, evidenciado a imigração como um dos factores vitais para minimização dos efeitos negativos do envelhecimento populacional na Europa, que assume proporções cada vez mais preocupantes. Sendo certo que a imigração não pode ser vista como um mero instrumento para resolver o problema demográfico, estes dados ajudam-nos a encarar os imigrantes de uma outra forma.
De qualquer modo, julgo que estamos a assistir na Europa um claro retrocesso dos direitos sociais e as várias conquistas estão cada vez mais comprometidas. A Europa está cada vez mais à direita. Os poucos governos de esquerda que ainda estão no poder são de uma esquerda altamente duvidosa ( Portugal é um exemplo).
Por outro lado e, porque a maioria dos governos estão à direita é mais fácil aprovar determinadas medidas ( ex.a directiva de imigração a possibilidade da semana de trabalho chegar as 78 horas) nos conselhos intergovernamentais do que, por exemplo, nos parlamentos nacionais.

quinta-feira, 28 de agosto de 2008

O Ministro Rui Pereira terá que explicar melhor


É incontestável o aumento da criminalidade em Portugal nos últimos meses e, por consequência, da percepção da insegurança por parte da população. Segundo alguns dados, a criminalidade aumentou 10% nos últimos dois meses. Ontem, 28 de Agosto, o Ministro da Adminitração Interna, na Grande Entrevista, na RTP, na tentativa de explicar o actual quadro legal e das medidas do Governo para travar o problema, referiu que, nos últimos dias, houve, entre outras medidas, um reforço de segurança nas fronteiras portuguesas por causa de imigração ilegal. Subjacente a essa medida, está algo que é recorrente nos discursos políticos e na população em geral, que é de associar a criminalidade à imigração. A ligação é muito fácil, mas é perigosa, injusta e falsa. O Ministro deveria explicar melhor e presta um péssimo serviço ao tentar arranjar bodes expiatórios para o problema da criminalidade em Portugal.
No dia 27, n Jornal da Noite da SIC e peça começa assim: uma estação de serviço foi assaltada por três indíviduos da raça negra, ou seja, três pretos. Lamentável que a comunicação insista em em fazer reportagens, potencialmente, racistas e discriminatórias.

A medalha do Nelson Évora


Custou muito mas Portugal conseguiu trazer o ouro da China. Muitos já não acreditavam que Portugal iria ganhar uma medalha de ouro nos jogos olímpicos mas o salto 16,67 metros do Nélson Évora deu-nos uma alegria indescritível a todos nós e colocou Portugal no pódio nesta modalidade. Foi fantástico ver o Nelson Évora abraçado à bandeira portuguesa. Seria, porém, muito chato e uma autêntica derrota, se Portugal não conseguisse ganhar nenhuma medalha de ouro nesses últmos jogos olímpicos. Para alguns países, nomeadamente, os de menos recursos, participar já é uma vitória e não existe nenhuma expectativa em torno das medalhas. Portugal, porém, já passou esta fase e quando os atletas portugueses estão numa competição (pelo menos em algumas modalidades) é para ganhar.A medalha de ouro conquistada por Nélson Évora no triplo salto dos Jogos Olímpicos tem um significado muito especial, porque é um exemplo acabado do tipo de sociedade que almejamos construir, valorizando a diversidade e não fazendo com que o local de nascimento seja um factor de discriminação como é, para o caso de milhares de imigrantes, que se encontram entre nós. Os pais de Nelson Évora nasceram em Cabo Verde e têm a nacionalidade cabo-verdiana. O atleta nasceu na Costa do Marfim, em 1984, obtendo a nacionalidade portuguesa em 2001. Muitas universidades norte-americanas ofereceram bolsas de estudo ao atleta para ir estabelecer nos Estados Unidos. Se o atleta acedesse à tentação era mais um ouro para os Estados Unidos e, nesta altura, o Presidente do Comité Olímpico Português estava com a cabeça a prémio. O local de nascimento é um acaso do destino e, hoje, é cada vez mais evidente. Ser português, nos dias que correm, não implica nascer, necessariamente, em Portugal. Ser português implica sentir e amar este país, sendo que esta noção é aplicável para qualquer território. Por isso, estou convencido que este sucesso do Nelson Évora irá nos ajudar a construir esse novo Portugal assente na diversidade e na pluralidade. Temos por este país todo muitos "Nelsons" que não irão dar nenhum ouro a Portugal mas que é necessário respeita-los e fazer com que possam dizer com o mesmo orgulho: sou português nascido no Brasil, Ucrânia, Angola, Paquistão ou outro sitío qualquer. É este o caminho que estamos convencidos que teremos de percorrer e a vitória do Nelson Évora é uma homenagem a todos que amam Portugal, independentemente do local de nascimento.
Por: Paulo Mendes