Todos os utentes do correio electrónico estão habituados a que as suas caixas de correio sejam inundadas por mensagens de diversa índole e, se algumas são filtradas pelos sistemas de segurança e remetidas para “spam” ou “publicidade não solicitada”, outras há para as quais não existe nenhuma barreira informática que as detenha, entram livremente e, neste caso, a triagem tem de ser feita pelo utilizador quer apagando-os de imediato por não ter tempo para ler tudo o que lhe é remetido, quer sujeitando a sua apreciação ao conteúdo e ao objectivo do remetente.
Há dois dias entrou na minha caixa de correio electrónico, vindo de um remetente conhecido, uma mensagem que consistia numa pequena provocação pois é do domínio público a minha ligação ao movimento associativo imigrante, bem assim como do meu interesse pelas migrações enquanto objecto de estudo e reflexão e o mail versava sobre um julgamento de cidadãos estrangeiros ocorrido no território nacional, o que na opinião do remetente tinha sido exemplar.
O título dado ao mail era sugestivo: “Que grande juíza”. A grandeza da juíza, como pude verificar ao ler o conteúdo, não se relacionava com nenhum atributo físico mas sim com as penas aplicadas a um grupo de cidadãos brasileiros que variaram entre os 12 e os 18 anos de prisão efectiva. Até aqui tudo bem. Os cidadãos cometeram de forma continuada um conjunto de crimes e foram justamente penalizados por isso.
Continuando a ler o mail cedo percebi que admiração e reconhecimento que o remetente do mail demonstrou pela juíza não se cingia sequer à aplicação da pena que resultou do julgamento mas sim, ao juízo de valor que a magistrada emitiu no final do julgamento e ao facto de aos cidadãos estrangeiros ter sido aplicada a pena acessória de expulsão.
(…) Isto não é vir do Brasil, achar que continuamos no Brasil e vamos assaltar (…), terá sido isto que a juíza disse no final da leitura do acórdão e que a par da pena de acessória de expulsão (repatriamento) deixou o remetente tão satisfeito com a juíza, pedindo aos céus e à terra que muitos mais seguissem o seu exemplo.
Pois bem! Julgo que o juízo de valor feito pela magistrada é profundamente xenófobo porque, nem no Brasil todos os brasileiros são desonestos e criminosos, nem os cidadãos brasileiros que vivem em Portugal podem ser confundidos com estes ou outros brasileiros que cometeram ou cometem crimes, sejam eles de que natureza forem. É perigoso e era perfeitamente dispensável a emissão de tal juízo de valor.
Quanto à pena acessória de expulsão lembremo-nos de que a sua aplicação linear nem sempre é uma boa e reconhecida medida, ou será que concordamos com os repatriamentos dos nossos conterrâneos vindos do Canadá e dos Estados Unidos e consideramos que isso não é um problema cuja dimensão social afecta quer os indivíduos quer as sociedades.
As leituras simplistas e aligeiradas nem sempre (nunca) são a melhor forma de entender as diferentes dimensões de um problema.
Aníbal C. Pires, Ponta Delgada, 23 de Março de 2010
Este texto foi publicado em: http://www.anibalpires.blogspot.com/
quarta-feira, 24 de março de 2010
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